O Ensinamento do Novo Testamento Sobre Pecado
Nos Evangelhos Sinópticos:
Em Marcos, Mateus, Lucas e Atos, pecado se refere à fonte das más ações ao invés de atos específicos. Os homens são uma ninhada de serpentes venenosas cujos corações estão cheios com o mal (Mateus 12:34). Marcos 7:21 lista doze males (começando com fornicação) que se originam no coração e tornam o homem imundo. Pecado implica o domínio de Satanás sobre o homem. Os Pergaminhos do Mar Morto ensinam que os homens estão sujeitos às regras de Belial, e os Sinóticos interpretam a missão de Jesus como uma confrontação com o poder de Satanás. Pedro descreve o ministério de Jesus como “fazer o bem e curar todos aqueles que tinham caído sob o poder do diabo…” (Atos 10:38). Paulo pregou para os gentios para que eles pudessem se converter “do domínio de Satanás para Deus, e receber… uma parte da herança dos santificados…” (Atos 26:18).
B. Nos Escritos Joaninos:
Quase sempre lemos na literatura Joanina sobre “pecado” ao invés de “pecados” específicos. Então, de forma comum pecado se refere a um poder que afasta o homem de Deus em um estado de total alienação. O papel messiânico de Jesus é tirar o pecado do mundo (João 1:29) concedendo o Espírito Santo. O Espírito resgata os cristãos da realidade do diabo. A comunhão com Deus através do batismo do Espírito destrói no homem a possibilidade de pecar (I João 3:5-9). O contraste entre o pecador e o crente perfeito é tão grande como a diferença entre luz e escuridão, verdade e falsidade, vida e morte.
I João demonstra a diferença entre o cristão e o pecador (3:3-10). O pecador aceita a regência de Satanás e age em conformidade. Entretanto, o cristão é liberado de Satanás, como demonstra seu comportamento. Ele tem fugido do domínio satânico. Assim, aquele que comete pecado é do mal (I João 3:8). Ele é um escravo (João 8:34) cujo pai é o diabo (8:44). Como os justos vivem sob a orientação do Espírito de Deus que habita em nós, os pecadores se deixaram ser seduzidos pelo adversário de Deus. Ou somos um filho de Deus ou do Diabo, vivendo na luz ou na escuridão.
C. Em Paulo e na Literatura “Paulina”:
A literatura Paulina se assemelha à teologia dualista de João. Como o Quarto Evangelho, Paulo acredita em um poder personificado do mal: “Belial” (II Cor. 6:15) ou “o homem de iniquidade” (II Tess. 2:8). Ela traça a dominação de Satanás até Adão (Rom. 5:14), enquanto I Timóteo atribui isto a Eva (2:14). Paulo estava familiarizado com listas de pecados que eram populares nos círculos pagãos, como também judaicos da época. Por exemplo, The Testaments of the Twelve Patriarchs nomeiam sete tipos de erros morais, o primeiro dos quais é “o espírito de fornicação” assentado no corpo e seus sentidos (T. de Rúben 3:2-8). Philo descreve 140 vícios que se originam do “prazer.”9 Como os gregos, Paulo enfatiza os pecados sexuais. Ele enfatiza nossas “paixões pecaminosas” (Rom. 7:5), especialmente quando ele condena a imoralidade generalizada do Império Romano. Isto também é visto na forma que ele identifica “avidez”10 com “fornicação” e “idolatria.” Para Paulo, a idolatria forneceu a fonte de desordens sexuais pagãs e “práticas antinaturais” (Rom. 1:24).
Muitos leitores de Paulo sentem que ele focaliza a fonte última do pecado na carne do homem. Por esta razão, o Paulinismo levou naturalmente para o dualismo de Marcion, o Gnosticismo, o encratismo Sírio 11 e o monasticismo egípcio. Paulo afirma que “o desejo da carne” é hostil a Deus (Rom. 8:7). Especialmente a carne é o lugar no qual surgem as paixões e é um terreno fértil para o pecado. Porque o homem é carnal, ele tem sido vendido ao pecado, como um escravo (Rom. 7:14). Assim, Paulo pôde escrever sobre nosso “corpo pecaminoso” (Rom. 6:6). Sua posição geral é muito clara: “Não faça nenhuma provisão para a carne satisfazer seus desejos” (Rom. 13:14).
Nem os dualistas gregos como Platão e nem os cristãos como Paulo acreditam que seja impossível dominar os desejos da carne. Assim, Paulo pôde dizer para os Coríntios: “Mas o corpo não é para a fornicação, senão para o Senhor, e o Senhor para o corpo… Não sabeis vós que os vossos corpos são membros de Cristo?… Ou não sabeis que o vosso corpo é o templo do Espírito Santo, que habita em vós, proveniente de Deus, e que não sois de vós mesmos?… glorificai, pois, a Deus no vosso corpo, e no vosso espírito, os quais pertencem a Deus.” (I Cor. 6:13-20).
O mais importante é a forma que Paulo personifica o pecado. Nos capítulos 5-8 de Romanos, ele fala quarenta vezes sobre o fato que todos os homens são governados pelo pecado. O pecado entrou no homem através de Adão, se espalhou por toda a raça humana e até mesmo afeta o mundo material. O poder do pecado opera através da carne do homem, despertando a concupiscência e se manifestando em inúmeras ações de ilegalidade. O pecado seduz o homem (Rom. 7:12), como a serpente seduziu Eva. Portanto, pecado se tornou o príncipe deste mundo. O homem somente pode ser liberado da tirania de Satanás através do dom vivificante do Espírito de Deus.
9 Treatise on Abel and Cain, XXXII.
10 Avidez – desejo por mais cobiça. Na história da Queda, o desejo de Adão e Eva pela árvore proibida é descrito como “cobiça” (Gen. 3:6).
11 Encratismo – crença que o corpo é mal; cf. Tatian, um antigo padre da igreja.